fonte: O Globo
por Alfredo Guarischi – médico, cirurgião geral e oncológico, especialista em Fator Humano, Organizador do SAFETYMED e do GERHUS
Escrevi uma carta a Papai Noel. Pedi coisas simples: leitos, medicamentos básicos e um jogo antigo chamado “Prenda os corruptos”.
Não fui atendido e vi que muita gente ganhou mais do que merecia.
Fiquei decepcionado, pois fui um médico comportado, assim como a maioria dos meus colegas, que fez o mesmo pedido e não foi atendida.
Sei que Noel, com seus mais de 500 anos de idade, nunca foi visto aferindo a pressão arterial ou fazendo um eletrocardiograma; está há muitos anos acima do peso. Porém jamais teve problema de próstata, necessitou de cateterismo cardíaco ou foi internado. É um solteirão supersaudável.
Acho que pode ter ficado chateado comigo quando escrevi sobre a obrigatoriedade de realizar uma colonoscopia, após os 50 anos de idade, que ele ultrapassou umas 10 vezes. Pode ser. Paciência, mas isso é muito importante.
O que eu e meus colegas pedimos foi muito pouco diante do que receberam alguns.
Os planos de saúde ganharam gordos aumentos. A isenção de impostos para alguns hospitais chega a cifras astronômicas, que vão mais alto que a Estrela de Belém. Talvez por isso gastem tento dinheiro em marketing. Grandes redes de hospitais estão sendo formadas. Os americanos foram às compras, e os chineses estão chegando.
A indústria dos medicamentos ficou superfeliz. Os preços dos remédios puderam aumentar sem problema. Criaram até fábricas de genéricos sem precisar provar sua eficácia com testes em humanos.
Por outro lado, a turma do SUS, Sistema Único de Saúde, deve ter feito muita coisa ruim, pois nada recebeu. O estranho é que, apesar disso, foram criadas muitas organizações sociais particulares, “sem fins lucrativos”, para atender às necessidades do SUS. Não há lógica pagar intermediários, na qual a atividade-meio ganha mais do que a atividade-fim. São tantas “beneberentes”, que acabam brigando para administrar hospitais e postos de saúde do SUS. Muito estranho!
As Agências de Certificação fizeram a festa. Todo mundo quer ter uma placa dizendo que foi avaliado por uma, principalmente se for internacional, certificando que atende aos protocolos de segurança. Mas para isso há um pequeno detalhe: tem que pagar, e é um tremendo mistério o custo total disso. Fica uma pergunta: se alguma coisa der errado, quem vai responder pelo erro, o profissional de saúde, o dono do estabelecimento ou a agência que disse que o estabelecimento era de qualidade e fazia um trabalho seguro?
Achei que deveria procurar o SACONA – Serviço de Atenção ao Consumidor de Natal – para questionar o critério do atendimento dos pedidos, mas um amigo jornalista investigativo (essa turma é fogo!) me disse que a PGN – Procuradoria Geral do Natal – vai tomar uma atitude quanto a esses presentes. Confidenciou que as turmas do Rio e de Curitiba estão também muito interessadas.
“Papai Noel, sei que você é leitor cativo do Blog do Noblat. Por favor, veja a possibilidade atender meus pedidos; eu posso esperar, os doentes, não.”